"A história é a filosofia inspirada nos exemplos."
Dionísio de Halicarnasso

sexta-feira, 28 de outubro de 2011

Paulão

Paulo César Batista dos Santos, o Paulão, é um ex-futebolista brasileiro. É o único itambacuriense que já jogou pela Seleção Brasileira de Futebol.

Nasceu no dia 25 de março de 1967. Seus pais são Manoel José Batista e Maria Ferreira Batista. A família tinha um restaurante bastante conhecido na cidade e dona Maria, mãe de Paulão, era a cozinheira responsável pelo preparo de pratos típicos.
 

Início da carreira

Paulão iniciou sua carreira no time do Vitória, em Itambacuri. Em 1983, o Vitória disputou em casa uma partida comemorativa contra o Cruzeiro. Paulão chegou a marcar gol e foi um dos destaques do jogo.

Percebendo as habilidades do rapaz, a equipe técnica do Cruzeiro fez um convite para que ele se juntasse ao time e fosse treinar em Belo Horizonte. Na época, Paulão tinha apenas 16 anos e trabalhava no restaurante da família. Muito apegado aos parentes, acabou recusando o convite.

No Cruzeiro

Tempos depois, resolveu tentar a sorte no clube que o despertara para a possibilidade de se tornar profissional. Assim, em 1985 Paulão estava nas categorias de base do Cruzeiro, onde ficou por 3 anos.
Em 1988, foi emprestado ao América do Recife, time que disputava a segunda divisão do campeonato local.

Com boas atuações, Paulão chegou a ser artilheiro do campeonato, ajudando o time a subir para a categoria principal. Após a passagem pelo América, voltou para o Cruzeiro em agosto de 1988.

Paulão era um zagueiro central com características importantes: marcava bem; tinha boa cobertura; ótima impulsão – o que lhe ajudava a marcar gols de cabeça; e chutava forte, tornando-se batedor de faltas em várias situações. Além disso, era considerado um jogador “raçudo”, porém disciplinado.

Disputou 114 partidas pelo Cruzeiro, saindo apenas no segundo semestre do ano de 1992. Suas principais conquistas no clube foram o Campeonato Mineiro de 1990 e a Supercopa dos Campeões da Libertadores da América, em 1991.

Paulão jogou também pelo Grêmio, Vasco e Benfica (Portugal).

Na Seleção

Quadro de convocados para a Seleção em 1990
Jogando pelo Cruzeiro, Paulão foi convocado pelo técnico Paulo Roberto Falcão, em 1990, para integrar a Seleção Brasileira. Estreou em um amistoso contra a Espanha no dia 12 de setembro do mesmo ano. Na época, o ex-treinador do Cruzeiro, Adílson Batista, também era jogador da seleção.

No total, Paulão disputou 8 partidas com a camisa amarelinha, sendo 7 enquanto jogador do Cruzeiro. Também entrou em campo na partida comemorativa dos 50 anos de Pelé, em Milão, na Itália.

Paulão integra a lista dos jogadores cruzeirenses que mais vezes entraram em campo pela Seleção Brasileira na década de 90, ficando atrás apenas do goleiro Dida (15 partidas) e do lateral direito Evanílson (8 partidas).


 Na comissão técnica

Paulão retornou para o Cruzeiro em 2007, como auxiliar do técnico Dorival Júnior. Ficou no cargo até a chegada do treinador Adílson Batista. Em seguida, foi exercer a mesma função no time do Vila Nova, em Nova Lima.

Homenagem

Foto da partida realizada pelo time de veteranos do Vitória em homenagem a Paulão
Em pé: Carlim (goleiro), Paulão, Zé Maria, Pregador, Gerinha Magalhães e Mauro.
Agachados: Jaime, Neném, Roberto de Zé de Adão, Gerinha e Cezinha.
 

sábado, 22 de outubro de 2011

Dr. Firmato

Antonio Firmato de Almeida (Canavieiras, 15 de agosto de 1900 – Belo Horizonte, 30 de janeiro de 1992) foi um médico e político que fez carreira em Itambacuri.

Ajudou a controlar uma epidemia de doenças tropicais que assolavam a região de Itambacuri e atuou na elaboração de importantes estudos científicos sobre tais doenças.

Foi o único prefeito eleito por três mandatos na cidade.


História

Antonio Firmato de Almeida nasceu na fazenda Seis Irmãos, próximo à cidade de Canavieiras, na Bahia. Seus pais, Manoel Firmato de Almeida e Francisca de Deus Almeida, faleceram quando ele tinha 10 anos de idade. Firmato e os irmãos passaram então aos cuidados do tio Melquíades.

Melquíades colocou os sobrinhos na Escola Primária em Canavieiras. Firmato concluiu os estudos nessa escola aos 14 anos de idade, mas foi trabalhar com o tio na roça. Anos depois, Melquíades convidou-o para retomar os estudos. Ele aceitou e foi para um colégio interno em Salvador – BA.

Ao fim do curso preparatório, Firmato ingressou na Faculdade de Medicina de Salvador. Formou-se médico, diplomado no dia 8 de dezembro de 1926, aos 26 anos, defendendo tese (então pré-requisito para o exercício da medicina) sobre a Doença de Nicolas-Favre.

Início da carreira

Começou sua carreira profissional em Canavieiras, substituindo um colega que havia entrado em férias. Ao final do período, mudou-se para Jequitinhonha. Dr. Firmato sonhava trabalhar em São Paulo e veio traçando um caminho sempre rumo ao sul. De Jequitinhonha foi para Araçuaí.

Em Araçuaí foi vitimado por uma grande enchente no ano de 1927, na qual perdeu tudo o que tinha. A cheia do rio Araçuaí arrasou toda a cidade. De Araçuaí seguiu então para Teófilo Otoni, de onde iria telegrafar à família para pedir dinheiro para comprar algumas roupas e continuar viagem.

Para chegar a São Paulo precisaria pegar o trem na Estrada de Ferro Bahia-Minas, em Teófilo Otoni, até a cidade de Caravelas, no sul da Bahia. Então deveria seguir de navio para a cidade de Santos, já no estado de São Paulo.

Chegada a Itambacuri

Nesse período, Itambacuri tinha aproximadamente 2 mil habitantes. Não existia rede de distribuição de água nem energia elétrica e havia muitos problemas de cunho estrutural. Além disso, uma séria epidemia de tifo e outras doenças tropicais castigavam a região.

Itambacuri não tinha médico, ficando a saúde a cargo dos farmacêuticos João Antonio e Joviano Antonio da Silva Pereira. A população, assustada com a epidemia, exigia um profissional da medicina. Os farmacêuticos foram então a Teófilo Otoni para tentar resolver a situação.

Por indicação de conhecidos em Itambacuri, eles chegaram ao Dr. Firmato com a missão de convencê-lo a aceitar o convite de ir para a cidade. Dr. Firmato não aceitou de imediato. Para tentar convencê-lo, fizeram uma oferta para que ele fosse, em princípio, apenas para ajudar a controlar a epidemia. Depois disso ele seguiria para São Paulo, podendo realizar seu sonho com a missão cumprida. Dessa forma, Dr. Firmato chegou a Itambacuri no dia 13 de Fevereiro de 1928.

Medicina e Pesquisa

Chegando na cidade, Dr. Firmato encontrou um cenário preocupante envolvendo doenças tropicais. As moléstias mais comuns eram: bouba, malária, tifo e leishmaniose. Além dessas, algumas verminoses também tinham grande incidência, como a esquistossomose.

O médico ajudou a controlar a epidemia e fez mais do que isso. Conseguiu chamar a atenção de autoridades sanitárias e políticos da época para a situação da saúde na região, fazendo com que Itambacuri fosse cenário de estudos premiados internacionalmente.

Entre os serviços de pesquisa realizados está a organização de um fichário onde ele registrou mais de 5 mil casos observados em sua clínica, com fotografias e anotações sobre as referidas doenças.

Com a atuação de Dr. Firmato, seus relatórios e correspondências, a situação do município foi chamando a atenção em grandes centros como Belo Horizonte, Rio de Janeiro e São Paulo, atraindo também os olhares da comunidade científica de outros países.

Pesquisadores como o peruano Hugo Pesce, professor de Dermatologia na Universidade de Lima; e Percy C. C. Garnham, professor de Medicina Tropical da Universidade de Londres, viajaram à Itambacuri para aprofundar seus conhecimentos.

No ano de 1967, o cientista sueco Dr. Sven Christiansen esteve na região, como representante da Organização Mundial de Saúde, para pesquisar sobre a bouba. O cientista constatou a erradicação total da doença em terras mineiras. Na época, o Dr. Christiansen foi auxiliado por profissionais locais da saúde, como o laboratorista José Marques de Oliveira.

Além desses, professores das Universidades Federais de Minas Gerais, São Paulo e de outros estados estiveram pela região. Entre eles, Amílcar Vianna Martins (Parasitologia), Oswaldo Costa (Dermatologia), Josefino Aleixo (Leprologia), Mauro Pereira Barreto (Parasitologia), Dr. Oliveira Castro (Biologia), o malariologista José Pelegrino, e os microbiologistas José Aroeira e Dr. César Pinto - do Instituto Instituto Oswaldo Cruz.

Dr. Firmato foi um importante colaborador do Dr. César Pinto na elaboração de um estudo de 247 páginas sobre vários subtipos de esquistossomose. A obra foi condensada pelo cientista inglês H. Harold Scott no volume 47 do Tropical Diseases Bulletin, editado em Londres no ano de 1950.

Vida Política

Com o prestígio adquirido como médico ativista nas áreas política e social, Dr. Firmato acabou entrando para a vida pública. Foi o único eleito por 3 vezes prefeito de Itambacuri.

Antes disso, foi indicado ao cargo durante a ditadura da Era Vargas, mas se recusou a tomar posse nessa condição. Candidatou-se pela primeira vez nas eleições de 1954, mas não conseguiu se eleger. Dr. Firmato foi prefeito nas gestões: 1959 – 1963, 1967 – 1971, 1973 – 1977.
Em pé: Dr. José Vasconcellos e Dr. Firmato. Sentados: padre Vidigal e o presidente JK.
Algumas realizações

Instalou, no ano de 1930, o primeiro Posto de Saúde e Higiene de Itambacuri, incluindo a cidade nos planos de melhoramentos do Serviço Especial de Saúde Pública (SESP). O feito, que se realizou durante a gestão de Dr. Vital e com o auxílio do vereador Wilson Lago Pinheiro, foi considerado uma grande conquista pelo fato da cidade não estar incluída nos planos do convênio com o SESP. O Posto foi ampliado no ano de 1962, já na gestão de Dr. Firmato.

Trabalhando em conjunto com o prefeito Dr. Vital, conseguiu mudar para a cachoeira do rio Poquim a rede condutora de água utilizada no consumo urbano. Posteriormente, em seu governo, inaugurou a Estação de Tratamento de Água, sob direção do SESP.

Nas suas administrações foram fundados o Grupo Educacional Prof. Tangrins e o Grupo Educacional de São José do Fortuna. Construiu o Mercado Municipal, a praça Farmacêutico João Antônio, a praça Tenente Lages e ampliou a rede elétrica urbana. Foi Diretor do Hospital São Vicente de Paula por mais de 20 anos. Construiu a Cadeia Municipal e remodelou o Aprendizado Carlos Prates. Várias outras conquistas aconteceram sob sua influência ou diretamente nas suas administrações.

Referências bibliográficas / Links para outras páginas

- PALAZZOLO, Frei Jacinto de. Nas Selvas dos Vales do Mucuri e do Rio Doce. 3ª Edição. Companhia Editora Nacional. São Paulo - 1973.

- PEREIRA, Serafim Ângelo da Silva. Homenagem do povo de Itambacuri ao ilustre amigo Dr. Firmato. Edição Independente. Itambacuri - 1990.

- Revista Itambacury Ano 100. Edição Comemorativa Independente - 1973.

- VIDIGAL, Pedro Maciel. Ação Política Volume II – Memorial. Editora Del Rey. Belo Horizonte - 1997.

- Palavras com links para ligações a outras páginas: Canavieiras, Belo Horizonte, doenças tropicais, Doença de Nicolas-Favre, Estrada de Ferro Bahia-Minas, Instituto Oswaldo Cruz, Era Vargas.

Sebastião Lopes

Sebastião Campos Lopes (Itambacuri - 1935) é um advogado itambacuriense.

Durante sua carreira, recebeu homenagens como a Medalha Desembargador Hélio Costa, pelos serviços prestados à Comarca; o título de Vicentino Benemérito, pelo apoio à Sociedade São Vicente de Paulo; e a Condecoração de Honra do Grande Oriente, oferecida pela Maçonaria.

História

Sebastião Campos Lopes, ou simplesmente Bá Lopes, como é conhecido, é o oitavo filho de uma família de 14 irmãos. Seus pais são Joaquim Lopes da Silva e Rita de Campos Neves.
 
O pai, Joaquim Lopes, foi um importante trabalhador na área da saúde, sendo um dos auxiliares do médico e prefeito Dr. Firmato no tratamento das endemias que acometiam Itambacuri. A mãe, Rita, era cozinheira das mais requisitadas, produzindo encomendas constantes para diversas famílias da cidade.

Estudos

Bá Lopes estudou até o terceiro ano primário no Grupo Escolar Frei Gaspar de Módica, em Itambacuri. Em 1949 mudou-se para Santa Tereza (ES) para seguir os estudos no Seminário Seráfico São Francisco de Assis, onde ficou até o final do ano de 1950. 

Em seguida, voltou a Itambacuri para terminar o ginásio no seminário local. De volta a cidade, Bá Lopes segue nas rotinas de um jovem estudante, com as obrigações e privações comuns aos integrantes do seminário.

Já em 1954, vai para Taubaté (SP) para fazer o noviciado na Ordem dos Frades Menores Capuchinhos. Nestes tempos, era chamado de Frei Joaquim de Itambacuri. Concluída mais esta etapa, voltou para a terra natal onde  ingressou no curso de Filosofia, concluindo os estudos em 1957.

Após o curso de Filosofia, Bá Lopes deixou a vida religiosa e mudou-se para Belo Horizonte. Na capital, foi trabalhar em um escritório de representação. Após esta experiência, mudou de emprego, indo para o banco Bradesco. Em 1961 resolve voltar para Itambacuri, onde sua família tinha uma torrefação. Bá Lopes passa então a ajudar na administração dos negócios de família, cuidando do Café Montenegro e da Churrascaria Montenegro.

O Advogado

Na época, havia pouca opção de estudo no interior do estado. Quando foi aberta a primeira faculdade de Direito da região, a Fenord, Bá Lopes foi instado a prestar vestibular. A esta altura, foi grande o incentivo do amigo Frei Agostinho, que deu todo apoio para que ele participasse do concurso.

Bá Lopes temia pela concorrência, pois já estava afastado dos estudos há 17 anos. Como argumento para que fizesse as provas, Frei Agostinho falou sobre a bagagem cultural que se adquire estudando em colégios de formação religiosa, o que daria ao candidato nível mais que suficiente para concorrer no certame.

Sendo assim, prestou o vestibular e foi aprovado para o curso de Direito, comprovando que os estudos da época do seminário realmente fizeram diferença.

No ano de 1970, Sebastião Campos Lopes começa sua jornada para se tornar advogado. Durante a faculdade, o estudante enfrentou percalços. Precisou terminar o curso na cidade de Governador Valadares, onde concluiu os estudos em 1975, já com 40 anos de idade, casado e com família. Diplomado, voltou para Itambacuri e abriu um escritório de advocacia.

Bá Lopes destaca a grande dificuldade que era poder estudar no seu tempo. Vindo de família pobre, a opção entre estudo e trabalho tinha um rumo orientando às satisfações imediatas de qualquer família naquelas condições: era preciso gerar dinheiro para matar a fome, para pagar as contas e seguir adiante. A opção de estudo, para muitos de seu tempo, era mesmo ingressar em Ordem Religiosa e, posteriormente, se fosse o caso, tomar outro caminho.

Homenagens 

Suas realizações vão além do campo pessoal. Profissional respeitado na região, no ano de 2007 Bá Lopes foi condecorado com a medalha Desembargador Hélio Costa. A homenagem é concedida desde 1995 pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG)  a pessoas que prestam relevantes serviços ao Poder Judiciário.

Bá Lopes foi voluntário na Conferência Vicentina de Itambacuri entre os anos de 1980 e 1995, realizando vários serviços nesse período.

Podem-se destacar as atividades administrativas e conseqüentes melhorias durante sua assistência na gestão do Hospital São Vicente de Paulo. Pelos trabalhos, recebeu dos confrades o título de Vicentino Benemérito.

Em 1984 ingressou na Maçonaria, onde foi por duas vezes Venerável Mestre, Orador por três vezes e Secretário por outras três vezes. A sete de julho de 2011, recebeu a condecoração de honra do Grande Oriente de Minas Gerais, em virtude dos seus feitos.

Atualmente, Bá Lopes encontra-se afastado das atividades da Maçonaria, mas é freqüente em seu escritório.

Fontes e Links

- J. PEREIRA, Serafim. Missionários Capuchinhos nas antigas Catequeses Indígenas e nas sedes de Rio de Janeiro, Espírito Santo e Leste de Minas (1840 – 1997). Cúria Provincial dos Capuchinhos do Rio de Janeiro – 1998. Página 623.

- Informações da página da Associação dos Magistrados Mineiros – AMAGIS, disponíveis em:

http://www.amagis.com.br/home/index.php?option=com_content&task=view&id=678&Itemid=127

- Informações do site do Tribunal de Justiça de Minas Gerais - TJMG, disponíveis em:

http://www.tjmg.jus.br/info/pdf/?uri=/servicos/cerimonial/agraciados_medalha_2007.pdf

- Entrevista realizada com Bá Lopes, no seu escritório, em setembro de 2011.
- Palavras ou expressões com links para textos complementares: Dr. Firmato, endemias, Ordem dos Frades Menores Capuchinhos, Maçonaria.

Domingos Pacó

Domingos Ramos Pacó (Itambacuri – 1867, Campanário – 1935) foi um intérprete e professor indígena bilíngüe.

Foi o primeiro professor indígena do aldeamento de Itambacuri. No seu legado, merece destaque a elaboração de um manuscrito onde ele apresenta um parecer sobre a origem das cidades de Itambacuri e Igreja Nova (atual Campanário).

História

Domingos Pacó é filho de Félix Ramos da Cruz e Umbelina Ramos da Cruz. O pai, Félix, já se encontrava estabelecido na região onde hoje é Itambacuri antes mesmo da chegada dos padres fundadores da cidade. A mãe, Umbelina, era uma índia filha do Capitão Pahóc.

Capitão Pahóc

Capitão Pahóc foi um chefe indígena que teve grande importância para o sucesso do aldeamento de Itambacuri. A missão dos fundadores não teria sido possível sem a negociação e conquista do apoio das lideranças indígenas que estavam sob o comando de Pahóc.

O grupo sob sua liderança era formado por 800 guerreiros, além de outros 100 homens localizados em regiões de limites, em pontos estratégicos, para a defesa contra possíveis incursões de inimigos.

Pahóc costumava se relacionar com os não-índios. Nessas ocasiões era acompanhado por um número considerável de membros da tribo e do língua (intérprete) Félix Ramos da Cruz – com quem já havia estabelecido parceria antes mesmo da chegada dos fundadores.

Félix Ramos da Cruz

Félix Ramos da Cruz tinha relações de amizade com o Capitão Pahóc e era um grande conhecedor da região. Além disso, era também um importante língua. Os línguas gozavam de reconhecido prestígio, advindo de sua habilidade em intermediar, por meio de simultânea tradução oral, aquela que era considerada uma difícil (e às vezes perigosa) comunicação entre indivíduos de diferentes culturas.

Os línguas não dispunham de livros para a aprendizagem do idioma, até porque, ao que se sabe, o primeiro registro do falar daqueles índios foi publicado apenas em 1909, na Alemanha, graças ao esforço de Bruno Rudolph - imigrante que elaborou dicionário em alemão da língua botocuda. Assim, a comunicação com os índios era orientada tão somente pelo esforço constante e habilidade dos línguas.

Félix casou-se com Umbelina, uma índia filha do Capitão Pahóc. A união inaugurou o livro de registros dos diretores do aldeamento, sendo o primeiro casamento oficializado em Itambacuri pelos fundadores Frei Serafim e Frei Ângelo, um ano após instalada a missão.
Dessa forma, Félix reunia não apenas a figura de um “nacional” que guardava profundos conhecimentos sobre a região e domínio da comunicação com os índios, mas também representava um elo ainda mais importante no trato de confiança com estes, sendo um importante mediador político.

Do relacionamento de Félix com Umbelina nasceu Domingos Ramos Pacó.

O Professor

Domingos Pacó foi o primeiro professor de origem indígena da região do aldeamento de Itambacuri.

Pacó foi alfabetizado pelos padres fundadores (diretores do aldeamento) e atuava como sacristão. Em seguida passou a exercer o cargo público de secretário, ecônomo e professor. Recebeu o título do magistério a 3 de janeiro de 1882, iniciando imediatamente suas atividades. Na época, Pacó tinha apenas 15 anos de idade.

O professor Pacó lecionava para filhos de indígenas e de não-indígenas em uma escola feita de pau a pique – localizada nas proximidades do convento da cidade.  Permaneceu no cargo por 19 anos, até ser substituído, em 1901, pelo professor Manuel Pereira Tangrins.

Manuel Pereira era um músico casado com uma índia. A alcunha Tangrins, que lhe foi dada pelos índios e é apresentada como sobrenome, significa “músico” na língua dos nativos.

A substituição de Pacó teria sido motivada pela negligência com o cargo. O professor havia se tornado alcoólatra, o que comprometia, além da saúde, as atividades como educador. Além disso, pode-se inferir que a demissão do professor tenha se imposto sob um novo conjunto de regras relativas à administração escolar dos índios, adotada nos primórdios da República pelos diretores da então colônia indígena.

O Manuscrito de Pacó

Uma das realizações de Domingos Ramos Pacó foi a redação de um manuscrito de grande valor histórico, considerado um dos raros documentos escritos por um índio brasileiro no século XIX.

O trabalho é apresentado em 22 páginas de papel almaço, redigido com bela caligrafia, e apresenta, entre outras impressões, uma visão particular sobre a origem das cidades de Itambacuri e Igreja Nova. A obra é intitulada “Pequena narração ou origem de como foi descoberto o Itambacuri – 1873”.

O manuscrito apresenta notícias históricas e é também interessante pelo expresso amor à raça e língua indígenas, contendo várias passagens escritas no idioma original de Pacó. Em uma dessas passagens, Pacó traça um auto-retrato e se coloca entre os primeiros professores de Itambacuri.

Ele fala também sobre os padres fundadores afirmando que eles, conhecendo sua inteligência e aproveitamento nas letras, pediram ao Governo Provincial autorização para incluí-lo no ensino do aldeamento indígena de Itambacuri.

Pacó aproveita para registrar que sua escola chegou a ter o maior número de matrículas de filhos de indígenas. No texto, também fica clara a mágoa com ex-alunos que tiveram com ele “conhecimentos úteis a respeito da instrução primária e, agora que ocupam cargos, sentem vergonha de dizer que foram educados por um professor indígena”. E segue, reprovando os que se envergonham da descendência indígena.

No seu relato, Pacó descreve uma visão da selva diferente da dos colonizadores. Para ele, a selva era um local de recreação, idéia que contrasta com os medos e perigos descritos pelos missionários. Pacó ressaltava que todos aqueles córregos, rios e serras já possuíam um nome em língua indígena antes mesmo da chegada dos colonizadores.

Segundo Izabel Missagia de Mattos, a memória da fundação da missão em Itambacuri, escrita pelo professor, pode ser lida não apenas como crítica, mas, no limite, como uma verdadeira denúncia da pedagogia excludente e da invisibilidade gerada sobre a participação do indígena no trabalho realizado pelos capuchinhos.

Fim da vida

Após deixar o magistério, Pacó retirou-se para as matas. Tempos depois, mudou-se para Igreja Nova (atual Campanário) onde, a pedido de moradores, chegou a abrir uma escola e lecionar.

Pacó foi casado com uma indígena de nome Zulmira Jupeti, com quem teve filhos.
O professor bilíngüe, figura de importância além da história itambacuriense, viveu seus últimos anos na cidade de Campanário, onde faleceu no ano de 1935.

Referências bibliográficas

- MATTOS, Izabel Missagia de. Civilização e Revolta – Os Botocudos e a Catequese na Província de Minas. EDUSC. Bauru – 2003.
- MATTOS, Izabel Missagia de. Domingos Ramos Pacó, professor bilíngüe e intérprete do aldeamento missionário do Itambacuri, MG. XXIV Simpósio Nacional de História, São Leopoldo - 2007. Seminário Temático Os Índios na História: Fontes e Problemas.
- PALAZZOLO, Frei Jacinto de. Nas Selvas dos Vales do Mucuri e do Rio Doce. 3ª Edição. Companhia Editora Nacional. São Paulo - 1973.
- BRASILEIRO, Danielle Moreira. O Aldeamento Indígena Nossa Senhora dos Anjos -
PACÓ: Memória e indigenismo no Vale do Mucuri – MG. Associação Nacional de História – ANPUH. XXIV Simpósio Nacional de História. São Leopoldo – 2007.

Fundadores de Itambacuri

Frei Serafim de Gorizia (Gorizia, 29 de maio de 1829 – Itambacuri, 3 de dezembro de 1918) e Frei Ângelo de Sassoferrato (Sassoferrato, 10 de abril de 1846 – Itambacuri, 2 de junho de 1926) foram padres missionários da Ordem dos Capuchinhos e fundadores da cidade de Itambacuri, Minas Gerais.


Frei Serafim e Frei Ângelo entre outros missionários.


Biografia - Frei Serafim

Frei Serafim nasceu na cidade de Gorizia, então território austríaco, mas que passou a integrar a Itália. Foi batizado como João Batista Madon. Seus pais eram Antônio Madon e Anna Maria Gomesck. Sua família pertencia ao alto escalão do governo austríaco.

Formou-se Engenheiro aos 20 anos de idade destacando-se, principalmente, em áreas como Ciências Sociais, Letras Filosóficas e Matemáticas. Com essas habilidades, venceu concurso para chefe de uma seção no Império Austro-Húngaro. Em um lugar de destaque e com sua competência, acabou despertando o respeito do Imperador Francisco José. O Imperador, ao tomar decisões importantes, costumava consultar a João Batista.

Em janeiro de 1858 foi enviado à Lombardia como chefe de uma comissão do império. João Batista conheceu então Giuseppe Garibaldi e foi por ele convidado a integrar a Carbonária, mas recusou. Foi na Lombardia que ele pôde conhecer de perto alguns membros da ordem criada por São Francisco e também refletir sobre a vocação religiosa, já manifestada.

Ainda em 1858, no dia 4 de maio, ingressou na Ordem dos Frades Menores Capuchinhos, na província de São Carlos, recebendo assim o nome de Frei Serafim de Gorizia.

Ao saber da decisão de João Batista, agora Frei Serafim, o imperador ordenou o envio de um médico ao convento do noviciado para que avaliasse se o jovem estava sofrendo das faculdades mentais. Se assim fosse, determinou o imperador, que o tirassem de lá e dessem o devido tratamento.

Após a realização de exames, foi considerado que Frei Serafim estava em perfeitas condições. O frei disse ao médico: “agradeço penhorado os cuidados do soberano, a quem dirá que estou gozando perfeita saúde e a paz, que só Deus sabe dar. Lamento, apenas, não ter conhecido antes este tesouro”.

No dia 30 de maio de 1859 fez a profissão simples e, decorridos os três anos prescritos, em 31 de maio de 1862, fez a profissão de votos solenes – por meio da qual o religioso consagra seu compromisso com a Ordem.

Por ser poliglota, Frei Serafim foi enviado a Trieste e incumbido da pregação para as minorias que ali existiam. O frei falava alemão, italiano, francês, esloveno, espanhol e, mais tarde, aprendeu também o português.

Teve início assim o seu ministério. Com o sucesso alcançado, Frei Serafim foi enviado como pregador e confessor à província dos Capuchinhos da Stíria-Ilíria, no Vale do Danúbio, na Áustria, com a carta obediencial de 1868.

Ficou neste posto por alguns anos. Suas atividades o tornaram apóstolo de todas as classes, bastante admirado, mas o sonho do Frei não era este. Ele queria ir além das fronteiras da Europa e levar seu apostolado onde fosse mais necessário.

Assim, em 18 de janeiro de 1871, chega a Roma com o objetivo de fazer parte das missões. Na cidade ele dispunha de meios para se preparar e seguir em missão ao Chile, como pretendia. E foi nessa situação que ele e Frei Ângelo se conheceram. 

Biografia - Frei Ângelo

Frei Ângelo nasceu em Colle della Noce, um povoado que pertencia à cidade de Sassoferrato, na Província de Ancona, Itália.
Foi batizado como Afonso Censi. Seus pais eram Lourenço Censi e Balduína Garofali. Afonso era de família pobre. Recebeu desde cedo educação cristã e freqüentava a igreja diariamente.
Gostava do ar místico dos conventos, onde ia constantemente em visita a dois tios: um Franciscano Observante e outro Capuchinho. Nessas visitas, o jovem Afonso começou a admirar o modo de vida daqueles filhos de São Francisco.
Aos 16 anos ingressou na ordem dos Menores Capuchinhos, vestindo o burel de São Francisco no dia 21 de novembro de 1863. Iniciou o noviciado no convento de Camerino com o nome de Frei Ângelo de Sassoferrato.

Nessa época, a Itália aspirava à sua independência e unificação. Aproveitando-se desse ensejo, seitas secretas desencadearam perseguição às ordens religiosas. Frei Ângelo fez os votos perpétuos no dia 21 de novembro de 1864 e, no ano seguinte, devido às convulsões revolucionárias e à supressão das ordens religiosas, foi obrigado a deixar sua pátria, indo para a França e, mais tarde, para a Suíça.

Durante seis anos continuou seus estudos aprofundando-se nas ciências filosóficas e teológicas, sob a direção do capuchinho italiano Frei José Fidélis, ex-definidor da ordem.

No dia 2 de abril de 1870 recebeu a unção sacerdotal. Mudou-se, então, para Grenoble, na França, e depois para Lucerna, na Suíça. No pouco tempo em que ficou em Lucerna, Frei Ângelo aprendeu elementos da língua alemã.

Nesse período, a Itália ainda enfrentava séria crise. Os religiosos se defrontavam com litígios que envolviam política e organizações como a maçonaria. Foi nesse ambiente que nasceu em Frei Ângelo a vontade de servir em missões. O próprio diretor, Frei Fidélis, reconhecendo suas qualidades, incentivou-o neste propósito. E ele assim fez.

Antes de seguir viagem para Roma, para tentar se inserir em alguma missão, Frei Ângelo passou por Sassoferrato e Colle della Noce, onde pôde rever sua mãe. Ele não a encontrava fazia oito anos, desde que se tornou sacerdote. A visita foi também uma despedida. Ele sabia que, indo para alguma missão, de lá não retornaria.

Sendo assim, no ano de 1871 estava em Roma, no Colégio São Fidélis, onde os futuros missionários se preparavam para partir. Frei Ângelo se apresentou com apenas uma carta de seu mestre.

O Encontro dos Missionários

Frei Serafim e Frei Ângelo se conheceram no Colégio São Fidélis enquanto se preparavam para as missões.

Frei Serafim pediu aos superiores para ser incorporado aos missionários que partiriam para o Chile, mas foi determinado seu embarque para o Brasil. Frei Ângelo não tinha preferências com relação ao destino.

Frei Serafim tinha então 43 anos e era um sacerdote experiente. Frei Ângelo tinha 27 e não conhecia muito além dos conventos.

Já em janeiro de 1872, Frei Serafim passeava pelo claustro do Colégio São Fidélis quando Frei Ângelo veio a seu encontro. Os dois não se conheciam e Frei Serafim perguntou-lhe o nome. Frei Ângelo respondeu e foi questionado se tinha algum país de preferência para o trabalho nas missões.

Ao responder que não, Frei Serafim o convidou a seguir com ele para o Brasil, pois procurava um companheiro que lhe ajudasse nas atividades missionárias. Frei Ângelo, que aguardava uma indicação do destino (ou divina), respondeu que sim.

Em 6 de fevereiro de 1872 eles receberam do superior-geral as “letras obedienciais”, estando assim nomeados como missionários apostólicos para o Brasil.
Partida para o Brasil

Antes de saír de Roma, os futuros missionários, cientes da responsabilidade que acabavam de assumir, prostraram-se em oração diante do túmulo de São Pedro e São Paulo, pedindo a Deus as graças necessárias ao êxito da missão.

Em seguida, o Papa Pio IX os recebeu para dar a bênção apostólica. O três conversaram por alguns minutos e o Papa se despediu com as palavras que Frei Ângelo registrou em seu caderno de anotações: “Ide, filhos caríssimos, evangelizai os indígenas e trazei-os ao aprisco do Senhor. A bênção de Deus e a Nossa Apostólica vos anime, vos fortaleça e vos ampare”.

No dia 19 de fevereiro os dois missionários partiram para Civitavecchia, onde embarcaram num pequeno navio costeiro que os levaria a Gênova. No porto da cidade encontraram o vapor Poitou, da companhia francesa Société Générale des Transports Maritimes à Vapeur, e a 10 de março seguiram para o Brasil.

O navio chegou ao Brasil após 25 dias de viagem. Os missionários seguiram para o convento do Morro do Castelo, no Rio de Janeiro, onde chegaram de surpresa. Eles foram recebidos com alegria pelo então comissário-geral Revmo. Frei Caetano de Messina e pelos demais religiosos da comunidade.

A Missão

Frei Serafim e Frei Ângelo ficaram no Rio de Janeiro apenas pelo tempo necessário para se orientarem acerca da missão e aprenderem os primeiros elementos da língua do país.

O governo tinha pressa em enviar missionários para ajudar a resolver uma séria situação que envolvia os índios da região do Mucuri, em Minas Gerais. Os missionários seriam responsáveis por chamar os índios da mata ao convívio da civilização e acabar com os repetidos massacres e incursões que espalhavam o terror.

O Ministro dos Negócios da Agricultura, Comércio e Obras Públicas – Barão de Itaúna – através da portaria baixada em 7 de junho de 1872, encarregou Frei Serafim de Gorízia da catequese dos indígenas nas colônias do Mucuri.

Ao mesmo tempo o Ministro comunicou ao Revmo. Comissário-geral dos missionários capuchinhos, Frei Caetano de Messina, a nomeação e requisição dos dois novos missionários. Por sua vez, Frei Caetano entregou-lhes as cartas obedienciais, discriminando as respectivas atribuições e confortando-os com sua bênção.

Alguns dias depois os missionários seguiram para Ouro Preto, então capital de Minas Gerais, onde receberiam instruções do diretor-geral de proteção aos índios, Sr. Brigadeiro Antônio Luís de Magalhães Mosqueira.

Para chegar a Ouro Preto seguiram até Juiz de Fora por estrada de ferro. Lá, foram recebidos pelo sargento Torquato Donato de Sousa Bicalho que, por ordem do diretor-geral, os levou a Ouro Preto. Esta parte da viagem foi feita a cavalo.

Frei Serafim e Frei Ângelo permaneceram em Ouro Preto por dois meses. Durante este período puseram-se a par da situação envolvendo índios e governo. Também aproveitaram para obter os conhecimentos indispensáveis ao bom desempenho da missão.

Providos de boa cavalhada e do necessário para a viagem, seguiram rumo a Filadélfia, hoje Teófilo Otoni, acompanhados pelo Sargento Torquato e por mais dois mestres. O itinerário a ser seguido era: Mariana – Morro do Pilar – Santa Maria de São Félix - Capelinha – Filadélfia.

Nasce Itambacuri

A viagem a cavalo durou 20 dias. A época do ano não era a melhor para uma incursão como aquela e as chuvas tornaram o caminho ainda mais penoso. Chegando a Filadélfia os freis tinham a missão de procurar o lugar ideal para instalar o aldeamento, desbravando as matas do Vale do Mucuri.

O povo de Filadélfia saudou com alegria a chegada dos franciscanos, na esperança de que ali ficassem. Mas não foi assim. Os missionários cumpriram as ordens recebidas ao saírem da capital do Império e deixaram o povoado de Filadélfia, retirando-se para a fazenda do Capitão Leonardo Esteves Otoni, distante de lá cerca de 25 quilômetros.

Capitão Leonardo se relacionava com algumas tribos de índios. Os Freis ficaram na fazenda por seis meses aprendendo, colhendo informações, fazendo observações, elaborando projetos e explorando a floresta à procura do melhor lugar para estabelecerem o aldeamento. Este lugar deveria servir como ponto estratégico para reunir diversas tribos de índios que vagavam nas imensas matas.

A floresta na região era densa, de mata fechada. Domingos Pacó[1] , filho das florestas da região, descrevia desta forma: “Era esta zona um lugar intransitável. Percorriam-no somente índios como: Crakeatan, Mucurim, Nhanhã, Catolés, Potão, Nacrechés, Aranãs e as feras bravias”.

Para se achar um local conveniente e de acordo com as instruções recebidas dos órgãos governamentais, era preciso estudar a região e percorrer a floresta bruta, tarefa difícil principalmente para dois freis – ainda mal aclimatados e nada familiarizados com semelhante empreitada. E ainda se deve levar em conta os grandes perigos que a selva oferecia.

Aos freis foram sugeridos alguns sítios como Potão, cujos terrenos ótimos estavam ocupados pelo Capitão Leonardo Esteves Otoni, a quem seria preciso indenizar. Os sítios Saudade, Planície e Cana Brava também apareceram como opção, mas não possuíam os requisitos exigidos e recomendados pelo governo Imperial. Tais sugestões partiam de interessados que, mais tarde, se revelaram inimigos da catequese.

O tempo passava e Frei Serafim se preocupava em encontrar logo o tal lugar. Na margem do rio São Mateus, o Frei mandou fazer uma derrubada, ajudado nesta tarefa pelos índios Potões, com os quais tinha estabelecido certa relação. Esses índios informaram a Frei Serafim da existência de um lugar muito melhor, não muito distante dali, rico em águas e com abundante caça e pesca.

O que os índios disseram seria exatamente o tipo de lugar procurado por Frei Serafim e seu grande auxiliar Frei Ângelo. O local ficava a 25 quilômetros de onde eles estavam. Frei Serafim abandonou então o rio São Mateus e seguiu com os índios tomando o caminho indicado por eles.

Na tarde do dia 19 de fevereiro de 1873, Frei Serafim, Frei Ângelo e o grupo que os acompanhavam chegaram ao alto da serra que divide as águas dos rios Itambacuri e Córrego d’Areia. Do alto dava pra ver o soberbo vale que lhes extasiava a vista. Era um panorama imponente de beleza selvagem. O Frei compreendeu ser aquele o lugar indicado pela vontade de Deus para plantar o marco da fundação do aldeamento e a tenda do seu apostolado.

Na ocasião, Frei Serafim profetizou: “Daqui não sairei jamais!”

A notícia de que os frades já se encontravam em Itambacuri, centro das matas virgens, onde nenhum não-índio havia chegado, correu longe e os índios começaram a afluir.

Nestes tempos já corria o mês de março. Com a aproximação da Páscoa, que nesse ano cairia no dia 13 de abril, os freis resolveram então celebrar uma Missa em comemoração. O lugar escolhido para a celebração foi a encosta do morro próximo ao Córrego dos Engenhos, onde foi feita a primeira derrubada e foram erguidos os primeiros ranchos. A missa foi celebrada em companhia de civilizados e selvagens.

Assim, o dia 13 de abril de 1873 é considerado o dia da fundação da cidade de Itambacuri. A partir daí seguiu-se uma série de trabalhos orientados sempre pela vocação e perseverança dos frades para a instalação da catequese. Foram muitas as dificuldades enfrentadas desde o início, mas eles sabiam que o projeto era maior que os problemas - como de fato acontece nas grandes obras.

Referências bibliográficas

- BRASILEIRO, Danielle Moreira. O Aldeamento Indígena Nossa Senhora dos Anjos - PACÓ: Memória e indigenismo no Vale do Mucuri – MG. Associação Nacional de História – ANPUH XXIV Simpósio Nacional de História. São Leopoldo - 2007.

- PALAZZOLO, Frei Jacinto de. Nas Selvas dos Vales do Mucuri e do Rio Doce. 3ª Edição. Companhia Editora Nacional. São Paulo - 1973.

- PEREIRA, Teodolindo A. Silva. Entre os Selvagens. Traduzido de Fra i Selvaggi – Samuele Cultrera. BDMG Cultural. Belo Horizonte – 2001.